O Complexo de Vira-Lata

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Muitas vezes vagando abandonados pelas ruas, revirando latas de lixo em busca de algum resto de comida, os cães sem raça definida-SRD são alvo de desprezo de parte das pessoas que só admiram animais com pedigree. Entre os nobres de outrora ou em parte dos novos-ricos da atualidade os vira-latas sempre foram alvo de repulsa e de pouco caso. Particularmente, já convivi com cães dos dois grupos e sei que ambos podem preencher adequadamente o posto de “melhor amigo do homem”. Cães com pedigree apresentam características previsíveis e podem atender determinadas necessidades de seus amigos humanos, mas os vira-latas são reconhecidamente mais adaptáveis e resistentes após anos de cruzamentos ao acaso entre animais que sobreviveram a condições precárias de alimento e abrigo. É o típico exemplo do vigor híbrido descrito pelos estudiosos da genética. A maioria dos vira-latas, especialmente os que ainda não tiveram seu valor reconhecido, tem o olhar triste como expressão do abandono de que são vítimas e só perdem esta característica quando aprendem a confiar em seu novo “melhor amigo”. Se não tiverem sua confiança frustrada, tornar-se-ão alegres e mostrarão, não raro, aguçada inteligência e eficácia nas tarefas que deles se espera. Já “Complexo de Vira-lata” é uma expressão criada pelo escritor e dramaturgo Nelson Rodrigues inicialmente para descrever a reação dos brasileiros estupefatos pela derrota do futebol do Brasil, em pleno Maracanã da Copa de 1950, frente aos uruguaios. Porém, como discorre Humberto Mariotti, em www.revistabsp.com.br, para Rodrigues o fenômeno não se limitava somente ao campo futebolístico. Segundo ele, “por ‘complexo de vira-lata’ entendo eu a inferioridade em que o brasileiro se coloca, voluntariamente, em face do resto do mundo”. Causa-me espanto que muitos brasileiros, deixando de lado tantas belezas naturais, riquezas e nosso povo tenazmente trabalhador, ainda insistam em desfazer do Brasil e em acreditar que outros países sejam modelos de perfeição a serem copiados. Nas redes sociais, na imprensa ou em rodas de conversa, afirmam sua convicção de que o país é ruim e desfazem de tudo que é nosso. Por óbvio, assim se manifestam considerando-se acima de tal maldição e desdita, já que a culpa sempre é dos outros. Ainda temos muitos problemas que precisam ser resolvidos e o principal deles é que escolhemos para nos governar, ou para elaborar nossas leis e fiscalizar seu cumprimento, pessoas inadequadas. Para evoluirmos mais é preciso ignorar o que diz quem ainda não se livrou do “Complexo de Vira-lata” e dar nossa contribuição ao futuro grandioso que pode ter o Brasil. Jeca Tatu, o caipira tosco e atrasado tipificado por Monteiro Lobato, já não existe mais na maior parte do pujante interior do Brasil, por exemplo. A nação brasileira ainda tem sérios problemas a serem resolvidos, mas não é só fazendo chacota do país ou de seu povo que a solução aparece. Otimismo desmedido não é prudente, mas pessimismo em excesso é o fim do futuro.

Júlio Telesca Barbosa
Engenheiro Agrônomo

 

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